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Pesquisadores revelam que ilhas brasileiras concentram espécies únicas e reforçam apelo por mais conservação



Estudo internacional propõe novo conceito para reconhecer endemismo em arquipélagos tropicai

Um estudo recém-publicado na plataforma científica Peer Community Journal propõe uma mudança significativa na forma como a biodiversidade marinha é compreendida em ilhas oceânicas. Liderado pelo biólogo Hudson Pinheiro, da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN), o levantamento analisou mais de 7 mil espécies de peixes recifais em 87 ilhas ao redor do mundo — e os resultados colocam as ilhas brasileiras em destaque global.

Arquipélagos como Fernando de Noronha, São Pedro e São Paulo, Trindade e Atol das Rocas apresentaram um número expressivo de espécies que só ocorrem nessas localidades — ou compartilham ocorrência entre poucas ilhas próximas, sem presença no continente. Esse padrão levou os cientistas a proporem um novo termo: Endemismo Provincial-Insular, que amplia a noção clássica de endemismo (restrição geográfica de espécies a uma única localidade).

“A ciência vinha ignorando espécies que não se limitam a uma ilha específica, mas estão restritas a pequenos grupos insulares. Isso cria um vácuo de reconhecimento sobre a real diversidade desses ambientes”, explica Pinheiro.

Uma nova Galápagos?

Durante décadas, o arquipélago de Galápagos, no Equador, foi considerado um dos maiores símbolos da biodiversidade endêmica. No entanto, os dados da nova pesquisa indicam que as ilhas brasileiras podem rivalizar — e até superar — esse status em algumas métricas de endemismo.

Pinheiro destaca que o avanço nas expedições científicas nos últimos anos tem revelado novas espécies e ampliado o conhecimento sobre aquelas que antes passavam despercebidas. “Muitas das espécies registradas nas ilhas brasileiras são totalmente novas para a ciência. E isso só reforça o valor desses ecossistemas como verdadeiros laboratórios da evolução.”

Risco invisível

Apesar da relevância biológica, os especialistas alertam para a fragilidade dos ecossistemas insulares. A localização remota, a dificuldade de acesso e a falta de financiamento para pesquisas tornam esses ambientes ainda mais vulneráveis — especialmente diante das mudanças climáticas.

“Enquanto no continente algumas espécies conseguem migrar para áreas mais frias, essa possibilidade praticamente não existe em ilhas oceânicas. Se as condições mudam, as espécies simplesmente não têm para onde ir”, alerta Pinheiro.

Essa limitação aumenta o risco de extinção silenciosa. Espécies podem desaparecer antes mesmo de serem descritas, principalmente nos chamados recifes mesofóticos — localizados entre 30 e 150 metros de profundidade — que ainda são pouco estudados.

Apoio e cooperação

A pesquisa foi possível graças a uma ampla rede de colaboração. Expedições organizadas pelo CNPq, com apoio da Marinha do Brasil e de organizações como a Fundação Grupo Boticário, permitiram o acesso a regiões remotas e o uso de equipamentos especializados.

Uma das inovações citadas pelos pesquisadores foi a criação da primeira estação de mergulho científico mesofótico da América Latina, implantada pelo Centro de Biologia Marinha da USP (Cebimar). A estrutura tem permitido que cientistas alcancem zonas profundas com segurança e realizem coletas inéditas.

Marion Silva, gerente de conservação da Fundação Grupo Boticário, reforça a importância do trabalho conjunto. “Proteger essas ilhas é garantir não apenas a biodiversidade, mas também a continuidade dos serviços ecossistêmicos essenciais para o planeta, como o equilíbrio climático e a saúde dos oceanos.”

Caminho para o futuro

Com os novos dados, os cientistas esperam influenciar políticas públicas, incentivar novos estudos e promover maior reconhecimento internacional das ilhas brasileiras como áreas prioritárias para conservação.

“O Brasil precisa olhar para suas ilhas com mais atenção. Não são apenas pedaços de terra cercados por mar. São repositórios únicos de vida e conhecimento científico, que merecem ser protegidos com urgência”, conclui Hudson Pinheiro.

com informações: EBC


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